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terça-feira, 8 de dezembro de 2015

O que é e como é o racismo


O que é e como é o racismo

Prof.° Marcos Carmo de Almeida

Segundo a definição do Wikipédia “racismo consiste no preconceito e na discriminação com base em percepções sociais baseadas em diferenças biológicas entre os povos. Muitas vezes toma a forma de ações sociais, práticas ou crenças, ou sistemas políticos que consideram que diferentes raças devem ser classificadas como inerentemente superiores”. Diante desta definição podemos fazer um autoquestionamento que ao mesmo tempo que é filosófico, é de teor cultural, social e político: nós (que estamos lendo este texto agora) somos racistas. Provavelmente diremos que não e que o racismo é um absurdo.
Pois bem... certa vez me contaram “Deus criou os seres humanos fez como se fosse um padeiro assando pães...modelando o corpo e o rosto como se fosse uma massa e em seguida os colocava no forno. Depois de várias fornadas... a última queimou e daí surgiram os negros. Deus teria se irritado com o acontecido e por isso como reação impulsiva deu um soco no nariz de um deles. O que fez com que o nariz ficasse achatado. Passados alguns segundos se arrependeu o consolou fazendo um cafuné na cabeça. Surge aí o cabelo enrolado do negro.” Se a sua reação é sorrir...você é racista. Alguns alunos dizem: “não professor, eu sorri porque a piada é engraçada”. E mais uma vez entra a indagação radical da filosofia: Por que que esta piada é engraçada?
Outra provocação que faço aos alunos se dá quando escrevo no quadro a frase: “Ele é preto, mas é muito competente”, e em seguida peço para que eles indiquem em qual palavra da frase eles acreditam que está contido o racismo. Para minha não surpresa quase que a totalidade de cada turma aponta a palavra preto como sendo racista. E para a surpresa desta quase totalidade tenho que informar que quem acredita que o racismo está na palavra preto, na verdade, está tendo um comportamento racista mesmo sem se dar conta disto.
Respondendo a primeira provocação: Por que a piada que fala de como surgiu o negro é engraçada? Porque dá vazão a um sentimento fruto de uma ideologia racista disseminada por séculos no mundo e em nosso país. Dá vazão ao sentimento de achar que o negro é inferior ao branco, coisa que com bem menos frequência acontece de forma direta e séria. Portanto a piada, o sarcasmo e o escárnio é a maneira mais fácil de propagar o racismo, pois ganha o ar de brincadeira.
Respondendo a segunda provocação: é obvio que o racismo está contido na palavra “mas”, pois se trata de um conectivo adversativo que no contexto da frase diz indiretamente que todos os negros são incompetentes, já que aquele negro da frase “é um negro diferenciado” que se destaca dos demais, já que sua competência vem precedida do “mas”, esta palavrinha que parece tão inocente, todavia tão perversa, quando utilizada desta maneira. E assim o racismo vai se proliferando quase que imperceptível.
Se algumas das principais tarefas da filosofia no ensino médio é despertar a consciência crítica no estudante e colaborar para a formação cidadã e, dentro desta perspectiva, se quisermos combater o racismo, temos primeiro que saber o que é o racismo, suas causas, consequências e formas. Se referir a alguém como preto não é racismo! Porém é racismo se referir a alguém descrevendo-o como preto e associando inerentemente o preto a coisas negativas, como observamos em expressões do tipo: “preto macaco”; “preto urubu”; “só podia ser serviço de preto para sair mal feito”; “todo preto é saliente”; “o preto quando não caga na entrada, caga na saída”. É quase que inevitável citar estes exemplos na sala de aula sem que não se arranque risos e até abruptas gargalhadas por parte dos alunos.
Dentro do debate alguns alunos dizem que tem muitos negros que se sentem ofendidos se forem referidos como negros ou pretos. Mas é necessário falar que o negro que não quer ser referido como negro é duas vezes vítima da perversa ideologia do racismo. Pois a maior perversidade do racismo é incutir na cabeça da sociedade e do próprio negro que a palavra negro ou preto por sí só já soa como algo negativo. Mas esta situação mesmo que complexa, deve ser exposta, enfrentada, compreendida e superada.

Existe raça entre os humanos?

Biologicamente não existem raças entre os seres humanos. A ciência nos mostra que as mínimas diferenças genéticas entre um ser humano e outro, não são suficientes para determinar diferentes raças.           
Uma só raça
 É claro que entre um senegalês, um cambojano e um italiano existem, evidentemente, diferenças físicas visíveis: cor da pele e dos olhos, tamanho, textura dos cabelos etc. Mas hoje em dia já sabemos que o patrimônio genético dos três é extremamente próximo. A descoberta dos grupos sanguíneos, da variação das enzimas, das sequências de DNA, dos anticorpos e tantas outras, puseram em evidencia o parentesco dos homens entre si, assim como sua extraordinária diversidade. Uma combinação de genes, frequente numa população e rara em outra, é, assim mesmo, potencialmente presente em toda parte.
A comprovação se deu em 2002, quando uma equipe de sete pesquisadores dos Estados Unidos, França e Rússia comparou 377 partes do DNA de 1056 pessoas originárias de 52 populações de todos os continentes. O resultado mostrou que entre 93% e 95% da diferença genética entre os humanos é encontrada nos indivíduos de um mesmo grupo e a diversidade entre as populações é responsável por 3% a 5%. Ou seja, dependendo do caso, o genoma de um africano pode ter mais semelhanças com o de um norueguês do que com alguém de sua própria cidade na África! O estudo também mostrou que não existem genes exclusivos de uma população, nem grupos em que todos os membros tenham a mesma variação genética.  

Pensemos um pouco... quando empregado a animais, para que serve o termo raça? Serve para diferenciar e classificar. Fazer isso no sentido de dizer “esta raça é boa e esta é ruim”. Se entre os animais o termo raça serve para classificar e determinar o melhor e o pior, seria diferente função da palavra raça entre os seres humanos? A partir disto pode-se gerar o seguinte sofisma: Se não há raça, não há racismo. Pode parecer lógico, porém seria o mesmo que dizer que se não existe Emília, Narizinho e companhia, não existiu Monteiro Lobato. Ou seja não existe raça entre os humanos, mas existe o racista que a qualquer custo quer fazer com que a raça entre humanos exista, para que assim a sociedade possa assimilar, mesmo que indiretamente, a inerente ideia de raça boa e da raça ruim.
É evidente que observamos que há diferenças entre os povos e a cada povo podemos chamar, ao invés de raça, de etnia que significa basicamente: um grupo de indivíduos que apresentam características biológicas e culturais semelhantes.
Quando lemos em jornais ou livros de história, sociologia ou até mesmo filosofia, termos como raça branca, raça negra, conflito racial e outros derivados, certamente trata-se de um infeliz equívoco de concepção desses atores. A nossa capacidade crítica deve transcender a triste tendência de tomarmos como verdade ou comum tudo aquilo que lemos nos jornais e livros.

A origem do racismo no Brasil

Considerando a grande trajetória da história da humanidade, podemos dizer que a escravidão negra no Brasil foi ontem, pois a abolição oficial ocorreu em 1888, sendo o último país da América a realizar este ato. Ou seja, poucas gerações antes a nossa vivenciaram o período da escravidão. Desta feita, recordemos a trajetória do povo negro no Brasil que pra cá veio sequestrado do continente africano para ser escravizado por quase três séculos.
Em meados do século XIX, os senhores donos de terra antevendo o inevitável dia em que prosperaria o movimento abolicionista culminaria na libertação do escravo, em 1850 trataram de promover a criação da Lei de Terras que consistia na determinação de que ninguém poderia possuir terra pública (que imaginamos naquela época haver em abundância) sem pagar ao governo. Em 1888 o negro foi liberto, mas o que estava reservado a ele se não a marginalização?
Na passagem do século XIX para o XX, os senhores donos de grandes plantações e de pequenas indústrias preferiram contratar mão de obra branca estrangeira do que contratar o negro. O próprio governo arquitetou e executou a propaganda e a imigração dos europeus pobres fugidos dos conflitos bélicos e das crises econômicas estabelecidos naquele continente. Por traz desta política de imigração promovida pelo Estado brasileiro existe uma motivação e uma estratégia pautada em uma ideia que seria cómica se não fosse trágica pelo mal que faz se implantar na sociedade brasileira. Esta ideia se apresenta como “teoria do branqueamento” que consiste na crença de que o Brasil daquela época não “evoluía” porque aqui havia uma grande mistura dos povos sendo a maioria de pele escura. Portanto seria necessário trazer europeus de pele branca para que com o intercruzamento genético e com o passar do tempo a população brasileira passasse por um processo de branqueamento e consequentemente por um processo de evolução.
Na esteira da herança de tudo isso se sustenta o racismo no Brasil até os dias de hoje. Por isso até hoje sofre o povo negro com a marginalização. Por isso os movimentos negros do mundo e do Brasil utilizam-se das cotas nas universidades como meio de ampliar o número de negros neste ambiente, que certamente reflete na ampliação da presença do negro no mercado de trabalho, no judiciário e na política. Por que antes da política de cotas, muito raramente se encontrava negros nos cursos de direito e medicina? O problema não está na porta da universidade, pois esta se abre a todos sem distinção. O problema está na trajetória do negro até chegar à porta da universidade. Portanto se antes raramente se via um negro em curso de direito ou medicina, a política de cotas garante esta presença como forma transitória e pontual de reparar a dívida histórica que o estado brasileiro e boa parcela da sociedade tem com os negros.

Os significados da cor morena

Muitas pessoas preferem se referir ao negro como moreno. E qual o porquê disto? Já vimos parágrafos acima esta é uma prática racista inconsciente, pois o indivíduo que se refere ao negro por moreno faz isto por temer ofender ou achar que é ofensivo chamar de negro ou preto.
Para não soar como exagero é admissível pensar que no nosso país que por conta da mixigenação gerou brasileiros de cores tão diversas e variadas. Se, por exemplo colocarmos lado a lado cem brasileiros, cem tons de pele serão identificados, talvez, inclusive o tal moreno. Porém declarar-se negro é uma questão política, uma tomada de posição e um gesto de etinicidade. Foi este gesto que percebi no personagem de uma piada que um amigo meu me contou e com a qual finalizo este texto: “dez moleques negros caminhavam pela praia faceiramente quando toparam numa lâmpada mágica. Dali saiu um gênio que ofereceu a cada um dos moleques a realização de um único desejo. O primeiro pediu para se tornar branco, o segundo pediu a mesma coisa, assim como os demais até chegar no nono menino. O décimo moleque ficou olhando a todos sorridentemente quando gênio o interrompe e pergunta: - Ô menino, tá sorrindo por que? Não vai fazer seu pedido? - Vou sim... o meu pedido é que todos os outros moleques voltem a serem negros imediatamente.”
Atividade
1.    O que é o racismo e por que sua manifestação travestida de humor é eficaz em disseminá-lo?
2.    Por que não é adequado atribuir o termo raça entre os seres humanos no sentido biológico e político?
3.    O que é etnia? O que é etnocentrismo em como ele se manifesta?
4.    Faça a análise da frase que será transcrita em seguida, indicando porque ela está impregnada de racismo. Eis a frase: “Apesar de ele ser preto é uma honesta e trabalhadora?”